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Roteiro pelo centro de Stuttgart


A estrela de três pontas da Mercedes no topo da estação ferroviária

         Stuttgart (ou Estugarda, seu nome em português pouco usado no Brasil) é conhecida como o berço alemão do automóvel, sendo a terra da Mercedes e da Porsche, como relatei no post anterior. No entanto a capital do estado de Baden-Württemberg tem muito mais a oferecer ao turista, especialmente no seu centro, onde a maioria dos visitantes se hospeda. É bem verdade que a vocação automotiva já fica aparente na própria estação ferroviária, um belo prédio  encimado por um grande símbolo girante da Mercedes-Benz, com cinco metros de diâmetro. 

A torre da estação ferroviária

            A cidade que hoje conta com 600.000 habitantes foi fundada no longínquo século X como uma espécie de haras. A palavra Stutengarten em alemão significa algo como "jardim das éguas" e é por esta razão que o símbolo estampado no brasão municipal é um cavalo levantado sobre as patas traseiras. Após evoluir para um entreposto comercial ao longo da Idade Média, Stuttgart se tornou a capital do reino de Württemberg no século XIV. Importante polo industrial, foi duramente bombardeada na Segunda Guerra Mundial, tendo seu casario histórico destruído.



        Stuttgart difere de outras metrópoles alemãs em um  aspecto: a área fronteira à estação ferroviária não é degradada, muito pelo contrário. Aproveitando a promoção em um site de reservas, acabei me hospedando no tradicional hotel cinco estrelas Graf Zeppelin (até o nome dá ideia de esplendor), bem em frente à estação. O hotel tem até um restaurante estrelado no Guia Michelin, o Olivo; curiosamente o nome do chef responsável era Nico Burkhardt, quase idêntico ao do personagem protagonista de uma das séries de TV que mais curto, Grimm, onde por coincidência a vizinha Floresta Negra desempenha um papel fundamental.

A Königsstraße, a rua principal de Stuttgart, ao entardecer com a torre da estação ferroviária ao fundo

           Quem quiser conhecer melhor o agradável centro da cidade não vai se arrepender. Um ótimo lugar de partida é a própria torre da estação ferroviária, com um pequeno mirante gradeado no terraço, que  tem acesso gratuito por elevador (foi subindo até lá que tirei a foto que abre o post). De quebra, se pode apreciar a vista de todo o centro, principalmente da Königsstraße, rua principal e maior calçadão de Stuttgart, que se inicia em frente à torre.

Schlossgarten com o Neues Schloss ao fundo

             O que surpreende o visitante é a quantidade de árvores. Podia-se esperar o contrário devido ao seu núcleo industrial, mas na realidade Stuttgart é uma das cidades com maior percentagem de área verde do mundo. O centro está situado num vale cercado por morros com parques e florestas. A cidade conta com um planejamento e legislação que delimita áreas com construção proibida, de forma a se ter ventilação permanente aproveitando as correntes aéreas e mantendo a qualidade do ar. Já do alto da torre é possível divisar o maior destes parques, afinal o Schlossgarten ladeia a estação. Longo e estreito, o parque criado há 600 anos como jardim do castelo real rasga a cidade por cinco quilômetros, indo do centro ao rio Neckar (o mesmo que banha a pitoresca Heidelberg), sobre o leito antigo de um afluente.

             Impossível não notar que o parque, antes um só, agora se encontra dividido por um enorme canteiro das obras de expansão da estação ferroviária para abrigar novas linhas de trens velozes. Batizado como Stuttgart 21, o projeto que obrigou ao deslocamento das plataformas de trem é extremamente polêmico, entre outras coisas por ter causado o abate de mais de 200 árvores do parque - houve gente que subiu nos galhos para impedir a derrubada, em vão. Nos andares  da torre da estação há uma exposição sobre o projeto, cuja execução atrasou graças às intermináveis discussões entre a população. O grupo pró-obra venceu um plebiscito por vantagem pequena.

O Staatstheater

          Já o trecho do Schlossgarten entre a estação ferroviária e o Neues Schloss, intocado pelas obras, está bem conservado, com um lago central com fonte. De quebra, à beira do lago está situado o prédio grandioso do Staatstheater, de 1912. A imponência do edifício faz jus às instituições que abriga; além da companhia de teatro, duas referências mundiais: a Stuttgart Opera e o Stuttgart Ballet. Esta companhia de balé tem um vínculo especial com o Brasil, pois foi a casa onde uma das maiores bailarinas do século passado, a niteroiense Marcia Haydée, dançou como primeira bailarina a partir de 1962. Em 1976 ela assumiu a direção do balé, cargo que ocupou por vinte anos, recebendo a cidadania honorária de Stuttgart e a Ordem ao Mérito alemã.

A frente do Neues Schloss

           À medida que vamos caminhando pela margem do lago e o Neues Schloss vai se aproximando, nos maravilhamos com a beleza da construção barroca. Só que esta não é a frente do Palácio Novo, e sim sua lateral. A bela fachada é coroada por um sem número de estátuas no telhado, e à frente do pátio duas colunas se elevam com um leão e um cervo, os dois animais que formavam o brasão da dinastia de Württemberg, hoje o brasão do estado.

               O Neues Schloss foi um capricho de um duque que subiu ao trono aos dezesseis anos e achou que o Altes Schloss, o então castelo real, era acanhado demais para abrigá-lo. Exigiu que construíssem um novo palácio, sob pena de passar a governar o reino a partir do Palácio de Ludwigsburg, a quinze quilômetros de distância, O novo palácio real, cuja construção se iniciou em 1746, levou sessenta anos para ser terminado, com o duque já tendo falecido há algum tempo. Destruído na Segunda Guerra Mundial, foi reconstruído na década de 60 e hoje abriga repartições do governo.

A Coluna do Jubileu na Schlossplatz, diante do Palácio Novo

            O palácio se abre para a praça que é o coração de Stuttgart, a Schlossplatz. Dominando a praça, a Coluna do Jubileu foi erguida para comemorar os 25 anos da ascensão ao trono do rei Guilherme I em 1841. Sobre seus trinta metros de granito repousa a estátua da deusa Concórdia. A praça está sempre ocupada por eventos, concertos ou demonstrações. Naquela tarde de sol, o gramado estava tomado por jovens, provavelmente oriundos das aulas da Universidade próxima. A coluna forma uma reta perfeita com a fonte, a entrada e a bandeira do palácio, para deleite dos fotógrafos.

          Do outro lado da praça, já na Königsstraße fica o Königsbau, com fachada clássica. Construído pelo mesmo Guilherme I com 34 colunas gregas na sua fronte, era uma casa de concertos e sede da Bolsa de Valores. Tendo o interior todo reformado na década de 90, hoje abriga um shopping, com lojas e praça de alimentação. Em contraponto, o Kunstmuseum, a galeria de arte ao seu  lado, tem uma fachada em vidro quadrada, sendo apelidado de "Cubo". Contém obras de mestres da arte moderna alemã.

A escultura de Alexander Calder na Königsstraße, com o Königsbau atrás e a quina do Kunstmuseum à esquerda.

            Complementando a modernidade do Kunstmuseum está a escultura de Alexander Calder, a Dobradura com Círculo Vermelho. Já tinha admirado em Chicago (metrópole reconhecida pelas suas obras-primas expostas nas ruas) outro trabalho deste especialista de esculturas em móbile a céu aberto. Ambos os trabalhos foram feitas em seus últimos anos de vida, na década de 70.

Altes Schloss, na fachada que dá para a Schillerplatz
         
            E quanto ao Altes Schloss ("Castelo Velho"), aquele esnobado pelo jovem duque? Este fica no lado sul da praça. Enquanto o Neues Schloss é um palácio, o Altes Schloss é mesmo um castelo, com torres e tudo (a palavra "Schloss" na língua alemã pode designar as duas coisas). Um primeiro castelo foi erguido no local na época da fundação de Stuttgart para proteger o haras, já o atual data do século XIV, quando os condes governantes passaram a residir na cidade. Hoje abriga o interessante Landesmuseum Württemberg, dedicado a apresentar a história da cidade e da Suábia, a região onde se localiza, desde a Idade da Pedra até a época moderna. A mostra inclui as Joias da Coroa, artefatos da antiga família real como o cetro e a rica coroa cravejada de esmeraldas e diamantes. Infelizmente cheguei quando o museu estava fechando, ele funciona de terça a domingo das 10 às 17h. Mesmo que você não entre no museu, não deixe de visitar o pátio interno do castelo, para apreciar os detalhes das sacadas ao seu redor, em estilo renascentista. O pátio recebe eventualmente concertos gratuitos de música clássica nos fins de tarde de verão.

O pátio do Altes Schloss, com a estátua do Duque Eberhard I, que governou Wüttemberg no século XV
             
          Já a praça colada ao Altes Schloss, a Schillerplatz, detém um clima bem mais tranquilo que a vizinha Schlossplatz, completamente rodeada por prédios com aparência antiga além do próprio castelo. Às terças, quintas e sábados pela manhã a praça ganha um colorido especial com um mercado de flores.

A bela Schillerplatz

           Diversos condes e duques que governaram Württemberg ao longo dos séculos estão enterrados na Stiftskirche ou Igreja do Colegiado, cujos fundos dão para a Schillerplatz, fazendo com que esteja praticamente diante do castelo. Estátuas dos duques  foram sendo adicionadas ainda à parede interna da igreja, formando uma galeria de soberanos lado a lado, muitos em suas vestes de luta. Cada uma destas estátuas foi erguida pisando sobre a estátua de um animal, representação impensável nos dias de hoje. Com construção iniciada no século XIII, a Stiftskirche, além de ser a igreja mais antiga, também é o templo luterano mais importante de Stuttgart.

A Stiftkirche diante do Altes Schloss na Schillerplatz

          Para fechar meu circuito pelo centro, fui conhecer Bohnenviertel ("Bairro dos Feijões"), a algumas quadras de distância. O nome exótico vem do hábito dos moradores pobres da área em séculos passados, que plantavam feijão nos seus jardins pequenos. Estes quarteirões escaparam da destruição das bombas na guerra e, revitalizados, apresentam um casario antigo em meio a ruas de paralelepípedo, algumas fechadas a pedestres, com lojinhas, antiquários e tabernas. Não vi muita graça no bairro, pelo menos à tarde. Melhor teria sido aproveitar o tempo para conhecer o Palácio Solitude, do século XVIII, situado a sete quilômetros do centro.

Escultura em fachada de Bohnenviertel

            No próximo post da série volto após cinco anos a uma das minhas regiões favoritas em toda a Europa, a Floresta Negra, para visitar mais duas cidades com jeito de conto de fadas, Triberg e Villingen.

⏩➧ Este é o sexto post da série sobre a viagem pelo sul e centro da Alemanha. Para visualizar os demais, acesse  Novo Tour pela Alemanha.


 Postado por  Marcelo Schor  em 24.08.2017      

4 comentários:

  1. Oi, Marcelo. Tudo bem? :)

    Seu post foi selecionado para o #linkódromo, do Viaje na Viagem.
    Dá uma olhada em http://www.viajenaviagem.com

    Até mais,
    Bóia – Natalie

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  2. Olá Marcelo, muitos, muitos parabéns por este fantástico roteiro. Estive recentemente na Alemanha, visitando a cidade de Colónia, mas ainda não tive oportunidade de conhecer Stuttgart e adorei o seu relato. Grande abraço e boas viagens.

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    1. Olá, Filipe.
      Muito obrigado pelo seu comentário. Feedbacks dos leitores são essenciais para vermos se o blog está atingindo sua finalidade.

      Stuttgart é mesmo uma cidade que merece ser incluída em um roteiro pela Alemanha.
      Abcs.

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