A fachada renascentista da Prefeitura e a Marktkirche |
Como o próprio final do seu nome já denuncia, Wiesbaden é uma estância termal, tendo todas as construções de uma localidade deste tipo - spa, fonte de água mineral e cassino, que deliciam os turistas em busca de relaxamento. Adicionalmente há uma rica herança arquitetônica legada como capital de ducado e depois como a atual capital do estado alemão de Hesse. Situada na região metropolitana de Frankfurt, por sinal bem maior, a cidade de 287.000 habitantes é incrivelmente bonita e vale a pena gastar pelo menos uma manhã ou tarde para vir conhecê-la.
A estação ferroviária de Wiesbaden, término das linhas de S-Bahn |
Wiesbaden é conectada a Frankfurt por nada menos que três linhas de S-Bahn, a S1, S8 e S9, levando o percurso de 40 a 55 minutos dependendo da linha. A S8 tem o trajeto um pouco mais longo por passar pela arquirrival Mainz, do lado oposto do Reno e capital de outro estado alemão. Além disso, o trem cruza duas vezes o mítico rio antes de chegar a Wiesbaden, ótima oportunidade para quem deseja vislumbrá-lo. Já a S9 atravessa o rio Main pouco antes de sua foz no Reno. Fui por uma linha e voltei pela outra. Minha ideia era passear pelas duas cidades, mas gostei tanto de Wiesbaden que acabei estendendo a estadia por lá e desisti de Mainz.
Wiesbaden remonta à época do Império Romano, quando as propriedades curativas de suas termas já eram difundidas. Cidade livre durante o Império Sacro Romano-Germânico, foi no século XIX por cinquenta anos a capital de um estado independente, o Ducado de Nassau. Nesta época foram erguidas várias das construções grandiosas que hoje embelezam o centro. Em 1866, após apoiar o lado perdedor na guerra Austro-Prussiana, o ducado foi anexado pela vitoriosa Prússia e a partir daí a fama de Wiesbaden como estância termal se consolidou dentro e fora da Alemanha. Quanto ao deposto Duque de Nassau, deu a volta por cima 24 anos depois, assumindo o reinado de outro país, vago por falta de herdeiros diretos. Quem pensou na Holanda devido ao nome Nassau se enganou - o trono ofertado foi o de Luxemburgo. Com efeito o atual Grão-Duque de Luxemburgo, Henri, é seu trineto, além de primo em primeiro grau do rei da Bélgica.
Vários prédios históricos de Wiesbaden se encontram ao redor da Schlossplatz, o lugar onde o núcleo medieval foi estabelecido. O palácio que dá nome à praça foi construído em 1840 pelo Duque de Nassau para ser sua residência e depois virou palácio de verão do Kaiser da Alemanha; hoje sedia o Parlamento do Estado de Hesse.
À sua frente está a Prefeitura Velha, o mais antigo prédio do centro de Wiesbaden, datado de 1610, sendo hoje uma seção de registros. Quando comparamos a construção acanhada com os seus vizinhos de praça bem mais imponentes, se pode ter uma ideia do crescimento da cidade quando passou a sede do ducado. A empena do edifício ao lado acaba desviando a atenção dos observadores pela sua pintura, de arte moderna e provocante. Nada a ver com o ar clássico e solene da área.
No meio da Schlossplatz encontramos a bela Fonte do Mercado ou Marktbrunnen, restaurada poucos meses antes e reluzindo de nova (ainda bem, já bastava de monumentos sob reforma na viagem!). A fonte também é chamada de Fonte do Leão devido à estátua dourada no seu topo. Não por acaso o leão é o animal símbolo da Casa de Nassau, e justamente a comenda maior de Luxemburgo é a Ordem do Leão Dourado de Nassau, também outorgada pelo Rei da Holanda. A ordem estampa o desenho do brasão esculpido sob as patas do felino na fonte.
E aqui vai uma constatação: quando viajei para Luxemburgo há sete anos, parti da própria Frankfurt. Se soubesse dos laços surpreendentes entre Luxemburgo e Wiesbaden, a teria inserido no roteiro na época. Seria muito interessante ter conhecido os dois lugares em sequência.
Fechando o cerco da fonte está a atual Prefeitura, construída em 1887 em estilo renascentista, danificada na Segunda Guerra Mundial e reconstruída na década de 50 bastante modificada. Se você der a volta na Prefeitura, terá a impressão de se tratarem de dois prédios devido à diversidade das fachadas. A da foto que abre o post é a original que escapou incólume da Guerra.
Ao lado da Prefeitura está a Marktkirche, uma igreja neogótica protestante com fachada marcante em tijolos vermelhos, causando um efeito muito bonito em dias de sol. A igreja inaugurada em 1862, também chamada de Catedral de Nassau, possui um carrilhão instalado no alto da torre central, que é o prédio mais alto de Wiesbaden, com 98 metros. O carrilhão é tocado três vezes diariamente - às 9 da manhã, ao meio-dia e às 5 da tarde.
Deixando a porção histórica de Wiesbaden e entrando no seu lado relaxante, temos um dos spas mais tradicionais do país, o Kaiser-Friedrich, localizado no lugar de uma terma romana e situado ao lado de um trecho de muro remanescente do século IV. O spa, tal qual seu quase homônimo em Baden Baden, adota a dispensa de trajes de banho. Suas águas são alimentadas pela fonte mais famosa de Wiesbaden, a Kochbrunnen (literamente "fonte fervente" - 67°C), que também aquece edificações do centro como a Prefeitura. Para quem se dispuser a provar a água mineral salgada, sulfurosa e portanto malcheirosa, há uma fonte na Kochbrunnenplatz. A praça em si não tem nada de mais, e estava lotada com barracas de quermesse no dia da minha visita, mal dava para ver a fonte.
Esta é a área mais nobre da Wiesbaden central, onde se localizavam os grandes hotéis da época áurea da estância termal, alguns sobrevivendo até os dias de hoje. O Bowling Green é um gramado rodeado por belos prédios clássicos e elegantes, dos quais se sobressai o Kurhaus, que abriga o cassino. Eterna fonte de atração para os turistas, o cassino teve como um dos seus frequentadores mais famosos o escritor russo Dostoyevski, que foi quase à bancarrota em suas mesas de jogo. A experiência o teria inspirado a escrever uma de suas obras mais conhecidas, O Jogador. Para apostar no cassino é necessário o uso de paletó e sapatos para os homens.
Ainda ladeando o Bowling Green, outra construção clássica que merece uma foto é o Hessisches Staatstheater, onde são apresentadas óperas, concertos e balés, com auditório em estilo barroco. Erguido a mando do Kaiser Guilherme II no final do século XIX, o teatro sedia anualmente desde a sua inauguração um dos mais importantes festivais alemães de música e arte teatral, o Festival Internacional de Maio.
Conhecidas as atrações do centro, tomei o ônibus 1 em direção a Neroberg, uma colina a dois quilômetros de distância, passando por um vale com várias mansões. A colina ("Morro de Nero"), cujo topo cercado por vinhedos está 80 metros acima da cidade, é acessada por um simpático funicular, com terminal junto ao ponto final do ônibus. Com tíquete de ida e volta custando €4,50, o funicular inaugurado em 1888 tem um sistema engenhoso de propulsão, por água. Ligado ao bonde de baixo por um cabo, o bonde que está no terminal do cume tem um compartimento sob o assoalho enchido com água. Mais pesado e ajudado pela gravidade, desce pelo trilho íngreme, puxando o outro bonde morro acima. A água é bombeada quando o bonde chega ao terminal do vale e reenviada para cima.
O cume do Neroberg é um lugar interessante para se visitar, uma colcha de retalhos em termos de atrações. Encontrei um monóptero do século XIX com vista para o centro de Wiesbaden, um playground para crianças e um café diante de um anfiteatro elíptico usado em eventos no verão. Uma torre estreita e isolada junto ao anfiteatro me deixou intrigado, pois me parecia totalmente deslocada no contexto, como se o restante da construção estivesse faltando. Acertei na mosca - havia um hotel grandioso em estilo alpino que se incendiou há trinta anos, só sobrando a torre. O Hotel Neroberg ocupava grande parte do topo do morro, ao lado do monóptero. O anfiteatro foi construído em seu lugar e engana bem, alguns podem até achar que devido ao nome do morro se trata de uma ruína romana.
Porém para chegar à atração mais pitoresca de Neroberg temos que descer por uma trilha curta em meio à floresta. De repente numa clareira aparece a Igreja Russa (mais uma coincidência com Baden Baden!). Afinal, o que faz em Wiesbaden uma igreja no estilo ortodoxo, coroada por cinco domos dourados em formato de cebola? Tudo se deveu a uma tragédia. O templo foi erguido em homenagem à Princesa Elizabeth Mikhailovna, sobrinha do czar russo e esposa do Duque de Nassau, aquele que se tornou Grão-Duque de Luxemburgo. A princesa de dezenove anos de idade estava casada há somente um ano quando faleceu em 1845 ao dar à luz uma menina natimorta. O Duque, muito abalado, resolveu construir a Igreja de St. Elizabeth para abrigar o sarcófago da esposa. O templo ortodoxo passou também a ser utilizado pelos russos que visitavam a estância alemã, como o czar Nicolau II, que acabou deposto pela Revolução Bolchevique. Lamentavelmente não pude visitar o seu interior, pois a igreja estava lotada com a realização de uma missa e só pude vislumbrá-lo rapidamente dos degraus na porta.
Com este post encerramos os relatos sobre as localidades alemãs percorridas nesta última viagem, mas falta ainda falar sobre a visita à alsaciana Estrasburgo. Aguardem!
⏩➧Este é o décimo primeiro post da série sobre a viagem pelo sul e centro da Alemanha. Para visualizar os demais, acesse Novo Tour pela Alemanha.
A estátua do duque Guilherme de Nassau diante da Marktkirche. |
Wiesbaden remonta à época do Império Romano, quando as propriedades curativas de suas termas já eram difundidas. Cidade livre durante o Império Sacro Romano-Germânico, foi no século XIX por cinquenta anos a capital de um estado independente, o Ducado de Nassau. Nesta época foram erguidas várias das construções grandiosas que hoje embelezam o centro. Em 1866, após apoiar o lado perdedor na guerra Austro-Prussiana, o ducado foi anexado pela vitoriosa Prússia e a partir daí a fama de Wiesbaden como estância termal se consolidou dentro e fora da Alemanha. Quanto ao deposto Duque de Nassau, deu a volta por cima 24 anos depois, assumindo o reinado de outro país, vago por falta de herdeiros diretos. Quem pensou na Holanda devido ao nome Nassau se enganou - o trono ofertado foi o de Luxemburgo. Com efeito o atual Grão-Duque de Luxemburgo, Henri, é seu trineto, além de primo em primeiro grau do rei da Bélgica.
Parlamento de Hesse e Fonte do Mercado na Schlossplatz |
Vários prédios históricos de Wiesbaden se encontram ao redor da Schlossplatz, o lugar onde o núcleo medieval foi estabelecido. O palácio que dá nome à praça foi construído em 1840 pelo Duque de Nassau para ser sua residência e depois virou palácio de verão do Kaiser da Alemanha; hoje sedia o Parlamento do Estado de Hesse.
À sua frente está a Prefeitura Velha, o mais antigo prédio do centro de Wiesbaden, datado de 1610, sendo hoje uma seção de registros. Quando comparamos a construção acanhada com os seus vizinhos de praça bem mais imponentes, se pode ter uma ideia do crescimento da cidade quando passou a sede do ducado. A empena do edifício ao lado acaba desviando a atenção dos observadores pela sua pintura, de arte moderna e provocante. Nada a ver com o ar clássico e solene da área.
A Prefeitura Velha e a Fonte do Mercado |
No meio da Schlossplatz encontramos a bela Fonte do Mercado ou Marktbrunnen, restaurada poucos meses antes e reluzindo de nova (ainda bem, já bastava de monumentos sob reforma na viagem!). A fonte também é chamada de Fonte do Leão devido à estátua dourada no seu topo. Não por acaso o leão é o animal símbolo da Casa de Nassau, e justamente a comenda maior de Luxemburgo é a Ordem do Leão Dourado de Nassau, também outorgada pelo Rei da Holanda. A ordem estampa o desenho do brasão esculpido sob as patas do felino na fonte.
E aqui vai uma constatação: quando viajei para Luxemburgo há sete anos, parti da própria Frankfurt. Se soubesse dos laços surpreendentes entre Luxemburgo e Wiesbaden, a teria inserido no roteiro na época. Seria muito interessante ter conhecido os dois lugares em sequência.
O leão da fonte encarando a Marktkirche e a fachada modificada da Prefeitura (à direita) |
Fechando o cerco da fonte está a atual Prefeitura, construída em 1887 em estilo renascentista, danificada na Segunda Guerra Mundial e reconstruída na década de 50 bastante modificada. Se você der a volta na Prefeitura, terá a impressão de se tratarem de dois prédios devido à diversidade das fachadas. A da foto que abre o post é a original que escapou incólume da Guerra.
Ao lado da Prefeitura está a Marktkirche, uma igreja neogótica protestante com fachada marcante em tijolos vermelhos, causando um efeito muito bonito em dias de sol. A igreja inaugurada em 1862, também chamada de Catedral de Nassau, possui um carrilhão instalado no alto da torre central, que é o prédio mais alto de Wiesbaden, com 98 metros. O carrilhão é tocado três vezes diariamente - às 9 da manhã, ao meio-dia e às 5 da tarde.
Bowling Green e Kurhaus |
Deixando a porção histórica de Wiesbaden e entrando no seu lado relaxante, temos um dos spas mais tradicionais do país, o Kaiser-Friedrich, localizado no lugar de uma terma romana e situado ao lado de um trecho de muro remanescente do século IV. O spa, tal qual seu quase homônimo em Baden Baden, adota a dispensa de trajes de banho. Suas águas são alimentadas pela fonte mais famosa de Wiesbaden, a Kochbrunnen (literamente "fonte fervente" - 67°C), que também aquece edificações do centro como a Prefeitura. Para quem se dispuser a provar a água mineral salgada, sulfurosa e portanto malcheirosa, há uma fonte na Kochbrunnenplatz. A praça em si não tem nada de mais, e estava lotada com barracas de quermesse no dia da minha visita, mal dava para ver a fonte.
Interior do Kurhaus |
Esta é a área mais nobre da Wiesbaden central, onde se localizavam os grandes hotéis da época áurea da estância termal, alguns sobrevivendo até os dias de hoje. O Bowling Green é um gramado rodeado por belos prédios clássicos e elegantes, dos quais se sobressai o Kurhaus, que abriga o cassino. Eterna fonte de atração para os turistas, o cassino teve como um dos seus frequentadores mais famosos o escritor russo Dostoyevski, que foi quase à bancarrota em suas mesas de jogo. A experiência o teria inspirado a escrever uma de suas obras mais conhecidas, O Jogador. Para apostar no cassino é necessário o uso de paletó e sapatos para os homens.
Ainda ladeando o Bowling Green, outra construção clássica que merece uma foto é o Hessisches Staatstheater, onde são apresentadas óperas, concertos e balés, com auditório em estilo barroco. Erguido a mando do Kaiser Guilherme II no final do século XIX, o teatro sedia anualmente desde a sua inauguração um dos mais importantes festivais alemães de música e arte teatral, o Festival Internacional de Maio.
Staatstheater |
Conhecidas as atrações do centro, tomei o ônibus 1 em direção a Neroberg, uma colina a dois quilômetros de distância, passando por um vale com várias mansões. A colina ("Morro de Nero"), cujo topo cercado por vinhedos está 80 metros acima da cidade, é acessada por um simpático funicular, com terminal junto ao ponto final do ônibus. Com tíquete de ida e volta custando €4,50, o funicular inaugurado em 1888 tem um sistema engenhoso de propulsão, por água. Ligado ao bonde de baixo por um cabo, o bonde que está no terminal do cume tem um compartimento sob o assoalho enchido com água. Mais pesado e ajudado pela gravidade, desce pelo trilho íngreme, puxando o outro bonde morro acima. A água é bombeada quando o bonde chega ao terminal do vale e reenviada para cima.
O funicular iniciando sua jornada rumo ao Neroberg |
O cume do Neroberg é um lugar interessante para se visitar, uma colcha de retalhos em termos de atrações. Encontrei um monóptero do século XIX com vista para o centro de Wiesbaden, um playground para crianças e um café diante de um anfiteatro elíptico usado em eventos no verão. Uma torre estreita e isolada junto ao anfiteatro me deixou intrigado, pois me parecia totalmente deslocada no contexto, como se o restante da construção estivesse faltando. Acertei na mosca - havia um hotel grandioso em estilo alpino que se incendiou há trinta anos, só sobrando a torre. O Hotel Neroberg ocupava grande parte do topo do morro, ao lado do monóptero. O anfiteatro foi construído em seu lugar e engana bem, alguns podem até achar que devido ao nome do morro se trata de uma ruína romana.
O anfiteatro e a torre que restou do Hotel Neroberg |
O Monóptero diante da cidade |
Porém para chegar à atração mais pitoresca de Neroberg temos que descer por uma trilha curta em meio à floresta. De repente numa clareira aparece a Igreja Russa (mais uma coincidência com Baden Baden!). Afinal, o que faz em Wiesbaden uma igreja no estilo ortodoxo, coroada por cinco domos dourados em formato de cebola? Tudo se deveu a uma tragédia. O templo foi erguido em homenagem à Princesa Elizabeth Mikhailovna, sobrinha do czar russo e esposa do Duque de Nassau, aquele que se tornou Grão-Duque de Luxemburgo. A princesa de dezenove anos de idade estava casada há somente um ano quando faleceu em 1845 ao dar à luz uma menina natimorta. O Duque, muito abalado, resolveu construir a Igreja de St. Elizabeth para abrigar o sarcófago da esposa. O templo ortodoxo passou também a ser utilizado pelos russos que visitavam a estância alemã, como o czar Nicolau II, que acabou deposto pela Revolução Bolchevique. Lamentavelmente não pude visitar o seu interior, pois a igreja estava lotada com a realização de uma missa e só pude vislumbrá-lo rapidamente dos degraus na porta.
A Igreja Russa em Neroberg |
Com este post encerramos os relatos sobre as localidades alemãs percorridas nesta última viagem, mas falta ainda falar sobre a visita à alsaciana Estrasburgo. Aguardem!
⏩➧Este é o décimo primeiro post da série sobre a viagem pelo sul e centro da Alemanha. Para visualizar os demais, acesse Novo Tour pela Alemanha.
Postado por Marcelo Schor em 04.11.2017
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