Marina de Calvi, na Córsega: início da epopeia da enchente na ilha francesa (ano 2015) |
Costumo ser previdente em matéria de viagens. Planejo bastante com antecedência e tenho um roteiro básico previamente definido. Necessidade de documentos como vistos e certificados de vacinações são checados. Hotéis são sempre reservados on-line, assim como eventuais tours de bate-volta. Mas às vezes imprevistos acontecem, seja por conta da natureza, pródiga em enchentes e erupções, ou devido a problemas técnicos, como atrasos de voos. Durante os meus mais de trinta anos fazendo viagens ao exterior, não escapei de enfrentar esses perrengues, desagradáveis na hora, mas que posteriormente acabamos nos divertindo quando rememoramos os apuros que passamos. Seguem alguns dos empecilhos que enfrentei, vários já narrados em posts do blog:
Nº. 1: Enchente na Córsega
Este certamente foi o mais inacreditável, não tanto por conta da enchente, mas sim pelos acontecimentos a seguir. Choveu muito durante meu terceiro dia na Córsega, quando estava hospedado na cidade de Calvi. No dia seguinte não pude fazer o trajeto ferroviário até a capital Ajaccio, devido a uma enchente monumental que ocorreu nas montanhas por onde o trem passa. Após cinco horas ilhado pelas águas na estação de trem numa vila no meio do caminho, nós desafortunados passageiros fomos informados que só restava voltar a Calvi por ônibus (único caminho desimpedido) e aguardar o dia seguinte. Lá chegando, ao me encaminhar para o hotel de onde tinha saído naquele mesmo dia, descobri que ele estava fechado (!!!) - depois fui saber que só reabriria em meados do ano seguinte, no início da média temporada. Encaminhei-me para um hotel perto e no dia seguinte, ao descer para pegar novamente o trem de manhã cedinho, todas as saídas estavam trancadas em meio ao lobby deserto e às escuras. A solução? Pular o muro baixo que separava um pátio interno da rua. Muita coisa inusitada acontecida num prazo de 24 horas !!!
A aventura está narrada em detalhes no post As águas de outubro na Córsega.
A aventura está narrada em detalhes no post As águas de outubro na Córsega.
Praça principal de Cusco (ano 2013) |
Nº. 2: Soroche em Cusco
Conheci o Peru através de um pacote em que viajava sozinho, mas era encaixado pela operadora nos respectivos tours ou excursões daquele dia. Só que o planejamento da organizadora em Cusco continha um erro crucial: agendaram o city-tour para poucas horas após a minha chegada vindo de Lima. Para agravar a situação, meu quarto não estava pronto, e não pude descansar até o início do tour. Não deu outra: ao visitar a Catedral, última parada do passeio, comecei a passar muito mal e praticamente desmaiei. Era o temível soroche, o mal da altitude, que acomete alguns visitantes nas terras altas do Peru - Cusco está a 3.400 metros de altura. Fui deitado no banco da igreja, respirando com um balão de oxigênio. Em alguns minutos estava melhor, mas com uma baita dor de cabeça. Fiquei o dia seguinte todo em repouso, perdendo o tour para Sacsayhuamán. Sorte que voltaria a Cusco no último dia do pacote, quando pude enfim andar pela cidade, já quase totalmente recuperado. Fica a lição, jamais subestime o soroche e caso venha do nível do mar, dedique a tarde de chegada ao descanso para se aclimatar paulatinamente ao menor oxigênio daquelas alturas. O mal só acomete algumas pessoas, mas convém não facilitar.
Problemas médicos podem ocorrer em qualquer viagem. Esta não foi a única vez comigo, já comentei antes no blog que sofri uma torção muito forte no pé durante uma viagem à Nova Zelândia há vinte anos - foram necessários quatro meses de fisioterapia posterior para a recuperação dos movimentos do tornozelo. Por isso é imprescindível viajar coberto por um seguro-saúde.
Problemas médicos podem ocorrer em qualquer viagem. Esta não foi a única vez comigo, já comentei antes no blog que sofri uma torção muito forte no pé durante uma viagem à Nova Zelândia há vinte anos - foram necessários quatro meses de fisioterapia posterior para a recuperação dos movimentos do tornozelo. Por isso é imprescindível viajar coberto por um seguro-saúde.
Veja o relato da minha visita no post Cusco, a cidade imperial inca.
Geleira enegrecida pelo depósito de cinzas do vulcão islandês (ano 2011) |
Nº. 3: Os efeitos do vulcão islandês Eyafjallajökull
Quem não se lembra do caos aéreo causado pela erupção do vulcão Eyafjallajökull em 2010? Pois é, eu estava de viagem marcada para a Islândia a partir de Frankfurt quando o vulcão de nome complicado entrou em erupção causando uma nuvem de cinzas inacreditável que parou o tráfego aéreo na Europa. A poucos dias de embarcar, não tive alternativa a não ser cancelar a viagem à Islândia, a substituindo por uma estadia (magnífica por sinal) em Baden-Baden, na Floresta Negra - foi a primeira de algumas visitas à região alemã. Isto sem falar nos prejuízos financeiros com os cancelamentos.
Como sou teimoso quando cismo com algo, um ano depois em 2011 programei de novo pôr os pés finalmente na Islândia. Desta vez voaria para Reykjavik a partir de Londres, minha primeira parada na viagem. Ao passar pela alfândega ao desembarcar em Heathrow, ao saber do meu próximo destino a inspetora soltou a bomba: um outro vulcão no leste da Islândia tinha começado a jorrar lava enquanto eu voava atravessando o Atlântico. Deve ter se divertido ao ver minha cara de espanto. Foram três dias de ansiedade, entrando em contato diariamente com a Icelandair para ver como estava a situação. Felizmente nesta vez a erupção foi curta e pude viajar tranquilamente para lá, mas o susto foi grande.
Veja como, mesmo um ano depois, me deparei com os efeitos da erupção do Eyafjallajökull, no post Sul da Islândia, de geleiras a vértebras de baleia. E para conhecer os detalhes da minha visita a Baden-Baden, clique em Baden-Baden, a rainha das estâncias termais.
Nº. 4: Extravio de mala
Ninguém está livre de um dos piores pesadelos de quem viaja por avião, o extravio da bagagem. Vivi duas vezes esta situação. Na primeira, em 2006, ao chegar em Barcelona num voo do Rio com conexão em Lisboa, nada de minha mala aparecer. Dirigi-me ao balcão de extravios, preenchi o formulário e a simpática senhora que me atendeu anotou o telefone da TAP para eu entrar em contato e acompanhar o desenrolar da procura. Após avisar meu seguro, tentei ligar várias vezes ao longo do dia para o telefone assinalado, sem conseguir completar a ligação. Já com a paciência perdida, fui ao escritório da companhia aérea e, surpresa, aquele telefone tinha sido desativado. De posse do número de telefone correto, finalmente pude saber que a mala tinha sido localizada e seria trazida ao hotel no fim da tarde do dia seguinte. Chegou só à noite, e com direito a um brinde adicional: uma bela pegada de sola de sapato bem visível na lateral da mala. Felizmente o conteúdo em si estava intacto.
A outra ocasião teve um aspecto cômico, e a bem da verdade não chegou a se configurar como extravio. Em viagem anterior em 2004, a bagagem não apareceu na esteira do aeroporto da siciliana Palermo após um cansativo trajeto pela Alitalia com duas conexões. Após a esteira parar (o momento mais temido por quem espera a bagagem aparecer), não vislumbrei um balcão para reclamar e então falei com um encarregado do aeroporto que estava passando naquele instante. Ele pediu para esperar, contatando alguém pelo rádio num italiano que não compreendi. Alguns minutos depois, eis que chega minha mala em cima do carrinho de transporte. Aparentemente ela havia jazido esquecida num canto do porão da aeronave... Nunca tinha ouvido falar de caso semelhante.
Haveria uma situação adicional em 2003, mas esta consegui impedir. No check-in do meu voo Paris-Rio, a atendente acionou a esteira para que minha bagagem fosse despachada. Foi aí que notei que algo estava faltando: a tag presa à mala com indicação do voo e aeroporto de destino. Sabe-se lá com que calma informei o ocorrido a ela. A mulher soltou um "Mon Dieu!!" e iniciou uma corrida desabalada e destrambelhada por cima da esteira para alcançar a mala antes que sumisse de vista pelo buraco da parede. Conseguiu alcançá-la a tempo e pedindo mil desculpas, finalmente afixou a tag. Desde então, sempre presto atenção total ao evento e confiro se as informações da tag batem com meu destino.
Se notarem as datas, dá a impressão de que houve dois "ensaios" de extravio em anos seguidos, até que o fato efetivamente ocorresse em Barcelona... Coincidência?
Em todo caso, sempre coloco uma muda de roupa na bagagem de mão, para minorar os danos imediatos se a bagagem não aparecer. Outra providência útil foi adornar minha mala (cujo modelo já não é dos mais comuns) com uma fita, de forma a diminuir o risco de que outra pessoa a pegue por engano na esteira.
Tudo bem, o brasileiro é conhecido por ser alegre e expansivo, mas de vez em quando nossos compatriotas agem de um jeito um tanto embaraçoso. Eu pelo menos me sinto constrangido ao presenciar estes acontecimentos. Meu rosto de estrangeiro (é incrível a quantidade de gente que me pára na rua para solicitar informação em cidades como Chicago ou Sydney) também colabora de vez em quando para me fazer passar por situações inusitadas. A mais divertida se deu novamente em Barcelona. Fui visitar o fantástico Parque Güell e embarquei num ônibus comum que estava bem cheio. Posicionei-me em pé junto a um casal sentado que, pelo idioma da conversa, logo percebi se tratarem de brasileiros. O papo logo se tornou totalmente surreal:
Ela: "Olha estes letreiros das lojas na rua. Essa gente da Catalunha é doida. Inventaram uma língua que parece com espanhol e francês, mas não é nenhum dos dois. "
Ele: "Shhh! Fala mais baixo. E se alguém aqui entende o que você está dizendo?"
Ela (em tom jocoso): "Como assim? Olha em volta! Você tá vendo alguém aqui com cara de brasileiro além da gente?"
E eu ali junto, fazendo o maior esforço para não cair na risada ou dar uma resposta à altura para a turista sem noção...
No próximo post uma nova série tem início, apresentando minha recém-ocorrida volta aos Bálcãs , com a visita a novas localidades da Croácia, além de Montenegro, Albânia, Macedônia e Sérvia.
Haveria uma situação adicional em 2003, mas esta consegui impedir. No check-in do meu voo Paris-Rio, a atendente acionou a esteira para que minha bagagem fosse despachada. Foi aí que notei que algo estava faltando: a tag presa à mala com indicação do voo e aeroporto de destino. Sabe-se lá com que calma informei o ocorrido a ela. A mulher soltou um "Mon Dieu!!" e iniciou uma corrida desabalada e destrambelhada por cima da esteira para alcançar a mala antes que sumisse de vista pelo buraco da parede. Conseguiu alcançá-la a tempo e pedindo mil desculpas, finalmente afixou a tag. Desde então, sempre presto atenção total ao evento e confiro se as informações da tag batem com meu destino.
Se notarem as datas, dá a impressão de que houve dois "ensaios" de extravio em anos seguidos, até que o fato efetivamente ocorresse em Barcelona... Coincidência?
Não é o Galeão, mas sim o corredor de embarque do aeroporto de Las Vegas (ano 2013) |
Em todo caso, sempre coloco uma muda de roupa na bagagem de mão, para minorar os danos imediatos se a bagagem não aparecer. Outra providência útil foi adornar minha mala (cujo modelo já não é dos mais comuns) com uma fita, de forma a diminuir o risco de que outra pessoa a pegue por engano na esteira.
Apêndice: Mico alheio
Esta é para descontrair.Tudo bem, o brasileiro é conhecido por ser alegre e expansivo, mas de vez em quando nossos compatriotas agem de um jeito um tanto embaraçoso. Eu pelo menos me sinto constrangido ao presenciar estes acontecimentos. Meu rosto de estrangeiro (é incrível a quantidade de gente que me pára na rua para solicitar informação em cidades como Chicago ou Sydney) também colabora de vez em quando para me fazer passar por situações inusitadas. A mais divertida se deu novamente em Barcelona. Fui visitar o fantástico Parque Güell e embarquei num ônibus comum que estava bem cheio. Posicionei-me em pé junto a um casal sentado que, pelo idioma da conversa, logo percebi se tratarem de brasileiros. O papo logo se tornou totalmente surreal:
Ela: "Olha estes letreiros das lojas na rua. Essa gente da Catalunha é doida. Inventaram uma língua que parece com espanhol e francês, mas não é nenhum dos dois. "
Ele: "Shhh! Fala mais baixo. E se alguém aqui entende o que você está dizendo?"
Ela (em tom jocoso): "Como assim? Olha em volta! Você tá vendo alguém aqui com cara de brasileiro além da gente?"
E eu ali junto, fazendo o maior esforço para não cair na risada ou dar uma resposta à altura para a turista sem noção...
No próximo post uma nova série tem início, apresentando minha recém-ocorrida volta aos Bálcãs , com a visita a novas localidades da Croácia, além de Montenegro, Albânia, Macedônia e Sérvia.
Postado por Marcelo Schor em 05.07.2018
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