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Praça da Liberdade com os prédios do Patrimônio Cultural e do CCBB ao fundo |
Tendo visitado Belo Horizonte pela última vez quando era adolescente nos anos 80, foi como se eu estivesse conhecendo um lugar novo. Meu intuito era passear pela Praça da Liberdade e seus museus, por isso me hospedei na Savassi, bairro que me encantou com suas ruas arborizadas, restaurantes e atrações culturais. Por sinal, foi com satisfação que encontrei na Savassi vários exemplos de um tipo de loja em extinção no Rio: as livrarias de rua.
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O bairro da Savassi |
Belo Horizonte é uma cidade construída na última década do século XIX, planejada para substituir a então capital Ouro Preto. Seus arquitetos se basearam em outras cidades planejadas como a norte-americana Washington e a argentina La Plata, desenhando quarteirões em formato xadrez dentro dos limites da Avenida do Contorno, cortados por largas avenidas em diagonal. Tiveram uma ideia original, batizando as ruas no sentido norte-sul com os nomes dos estados brasileiros existentes na época por ordem geográfica; com isto, é facílimo nos localizarmos na área central sem consultar um mapa. Só não entendi porque entre as Ruas São Paulo e Santa Catarina fica a Rua Curitiba, não deveria ser Rua Paraná?
Já a Savassi, uma das áreas mais nobres da cidade, só virou oficialmente um bairro há quinze anos. Tudo começou com a padaria Savassi, que levava o sobrenome do seu proprietário. A padaria chegou a ser depredada e saqueada durante a Segunda Guerra Mundial devido à origem italiana do nome, mas depois caiu no gosto popular e ficou tão famosa que se tornou ponto de referência. Passou a nomear informalmente a praça onde estava localizada, e depois de algum tempo, toda a região. Seu prédio acabou demolido em 1977.
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Praça da Liberdade |
A maior atração turística da Savassi é sem dúvida a Praça da Liberdade. O local para a sede do Poder Executivo do estado foi estrategicamente escolhido no ponto mais elevado da área onde a cidade estava sendo construída (e isto significa que é impossível alcançar a praça a pé sem encarar ruas em rampa...).
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Outro aspecto da Praça da Liberdade |
A praça é uma das mais belas que já conheci, apresentando jardins em estilo francês bem cuidados, coreto, fontes e chafarizes. Os bancos nos convidam a sentar e apreciar o cenário cercado pelos casarões centenários restaurados que antes abrigavam as secretarias estaduais. A aura nostálgica da praça é reforçada pela aleia de palmeiras imperiais com calçamento em paralelepípedo que a corta de ponta a ponta, chamada Alameda Travessia (algo a ver com a linda música de Milton Nascimento?). Aliás, outro motivo de surpresa foi este tipo de calçamento ainda estar presente em várias ruas transversais do bairro.
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Palacete Dantas (Secretaria de Cultura) no acesso à praça pela Avenida Cristóvão Colombo |
Com a remoção das secretarias para a nova Cidade Administrativa há onze anos, foi proposta a ótima ideia de transformar os casarões em museus, surgindo desta forma o Circuito Cultural da Praça da Liberdade. Conhecer a praça e apreciar as exposições sobre os mais diversos temas nos museus é programa para pelo menos um dia inteiro.
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Alameda Travessia na Praça da Liberdade, com o palácio ao final |
Parte integrante do Circuito Cultural, na extremidade sul da praça está o Palácio da Liberdade, onde se situava o escritório e moradia dos governadores de Minas Gerais antes da transferência para a Cidade Administrativa. Desde então cabe a cada governador decidir se o utiliza para suas atividades. Inaugurado em 1897 com fachada em estilo neoclássico, o palácio já hospedou governadores que a seguir se tornaram presidentes da República, como Tancredo Neves (1983-84) e Juscelino Kubitschek (1951-55), além de Itamar Franco (1999-2002), que primeiro foi presidente. Com interior ricamente decorado, o palácio está aberto a visitação nos fins de semana com agendamento prévio.
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Palácio da Liberdade |
Além do palácio, os principais museus e galerias participantes do Circuito Cultural da Praça da Liberdade são:
- o Memorial Minas Gerais, ocupando o casarão creme da antiga Secretaria da Fazenda que foi inaugurado com a praça em 1897. Gerido pela Vale, apresenta exposição permanente sobre a história de Minas Gerais e de Belo Horizonte. Está aberto normalmente ao público.
- o Museu das Minas e do Metal, ocupando o casarão rosa da antiga Secretaria de Educação que também é da época de inauguração da praça. Gerido pela Gerdau, apresenta exposição permanente sobre a história da mineração e da metalurgia. Está aberto normalmente ao público
- o Centro Cultural do Banco do Brasil, ocupando o casarão amarelo em estilo neoclássico da antiga Secretaria de Segurança Pública. Para visitar suas exposições, deve-se atualmente realizar agendamento on-line
- a Casa do Patrimônio Cultural, que ocupará o casarão azul da antiga Secretaria de Viação e Obras, ainda não está aberta ao público.
- o Espaço do Conhecimento UFMG, fechado ao público devido à pandemia.
- o Museu Mineiro, na Avenida João Pinheiro 342, a duas quadras da praça, ocupa o casarão que abrigava o Senado mineiro. Possui um acervo eclético que inclui arte sacra, moedas, armas e uma pinacoteca com trabalhos de artistas brasileiros, incluindo Di Cavalcanti.
- a Casa Fiat de Cultura, na rua lateral do Palácio da Liberdade. Para visitar suas exposições, deve-se atualmente realizar agendamento on-line. Está apresentando até o final do ano uma elogiada mostra sobre a restauração das obras de Aleijadinho.
A maioria dos museus não abre às segundas (exceto CCBB, fechado às terças) e a entrada é gratuita.
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Fonte dos Desejos e Memorial Minas Gerais |
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Museu das Minas e do Metal |
O Memorial Minas Gerais me impressionou. Além do interior restaurado onde se destaca a escadaria central, o ponto alto da visita foi a sala em que os acontecimentos da Inconfidência Mineira são encenados através de nove quadros espalhados pela parede, cada um contendo um personagem histórico de papel relevante. Durante meia hora os personagens dialogam entre si, se movimentam e até "pulam" de quadro, dando uma ideia boa da evolução dos fatos ocorridos em 1792. Forma bem inventiva de se mostrar o que ocorreu. Tiradentes é retratado na maior parte do tempo como o típico herói discreto, sem a barba e cabelo comprido com que entrou para a posteridade, enquanto o governador Visconde de Barbacena e Joaquim Silvério dos Reis têm representação muito mais estereotipada como vilões em cena. Numa outra sala, a fundação e os primeiros tempos de Belo Horizonte são relatados num vídeo sob um ângulo inusitado - os fantasmas que assombram a cidade.
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Sala do Memorial Minas Gerais onde os personagens dos quadros encenam a Inconfidência. Da esquerda para a direita Alvarenga Peixoto, sua esposa Bárbara Heliodora e Tiradentes. |
O entorno da praça não possui somente prédios clássicos. Lá se encontra também o modernista Edifício Niemeyer, projetado pelo mestre arquiteto em 1951. Por si só um cartão postal, suas curvas graciosas na fachada remetem à serra mineira e o fazem de certa forma se assemelhar ao paulistano Edifício Copan, também projetado por Oscar Niemeyer na década de 50. Um aspecto interessante que li é o fato de Niemeyer ter colocado o prédio sobre pilotis com o térreo vazado, de maneira que a Serra do Curral pudesse ser vista através dele desde a praça. Naturalmente devido à verticalização da cidade isto hoje é impossível de se constatar.
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O Edifício Niemeyer |
De estilo ainda mais moderno e ocupando posição fronteira ao Niemeyer no outro lado da praça está o chamado Edifício Rainha da Sucata. O apelido já dá uma pista da época da sua construção, 1990, quando a novela das oito era sucesso de audiência, e alude à miscelânea de estilos que provocou rejeição da população à obra. Faço coro com a opinião geral, o estilo é arrojado demais para o local onde está situado. Desde a sua inauguração o Rainha da Sucata teve vários usos, mas no ano passado foi designado para sediar a Casa Funarte, se tornando mais um espaço cultural do Circuito. .
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O pós-moderno Edifício Tancredo Neves, mais conhecido como Rainha da Sucata |
Quem estiver na Praça da Liberdade não pode deixar de andar dois quarteirões na vizinha Rua da Bahia para apreciar uma das mais bonitas igrejas belo-horizontinas, a Basílica de Lourdes, em estilo neogótico.
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A Igreja de Lourdes, no bairro homônimo. |
A Savassi é conhecida por seus restaurantes e bares, cujas mesas espalhadas pelas calçadas nas esquinas lotam nas noites de fim de semana. Gostei demais do A Pão de Queijaria, na rua Antônio de Albuquerque 856, uma loja pequena especializada em pães de queijo que pode até passar despercebida por quem caminha na rua, mas que já entrou em lista publicada de melhores restaurantes. O carro-chefe são os sanduíches de pão de queijo com recheios variados. Pedi o de pernil de lata, que mais parecia um mini-hambúrguer, acompanhado por polenta frita. O sanduíche veio bem quente e levava pernil suíno, molho chutney de maçã e queijo minas, formando uma combinação diferente e saborosa. Uma experiência gastronômica mineira por excelência.
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Pão de queijo de pernil no A Pão de Queijaria |
Postado por Marcelo Schor em 19.11.2021
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