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Teresópolis e seus encantos serranos

 

O Dedo de Deus ao centro, visto do Mirante do Soberbo

         Teresópolis, situada a 90 quilômetros de distância do Rio, é uma cidade encantadora situada na Serra dos Órgãos. Refúgio habitual de cariocas nos fins de semana, é a cidade mais alta do estado, a 870 metros de altitude, o que faz com que possua um clima bem mais ameno que a capital. Repleta de atrações, Teresópolis (ou  simplesmente Terê para os íntimos) é sede de um dos mais famosos parques nacionais brasileiros. E é conhecida em todo o país por abrigar a concentração da seleção brasileira de futebol na Granja Comary. 

Estátua de Teresa Cristina no Mirante do Soberbo


               O nome é uma homenagem à Imperatriz Teresa Cristina, que se encantou com a região que visitou algumas vezes. Teresópolis forma portanto uma dobradinha inusitada com a vizinha Petrópolis, nomeada em honra de  D. Pedro II. É curioso saber que a cidade somente recebeu o nome Therezópolis quando se emancipou de Magé em 1891, antes a vila se chamava Santo Antônio do Paquequer, rio que a corta. Foi uma homenagem póstuma. Teresa Cristina faleceu em dezembro de 1889 em Portugal, somente 43 dias após seu marido ser destronado e horas depois de receber a notícia de que sua família não poderia pôr os pés novamente no Brasil. A imperatriz é duplamente reverenciada por uma estátua no Soberbo, na entrada da cidade, e no nome do palácio que abriga a prefeitura, uma construção de 1927 em estilo neocolonial. 

Palácio Teresa Cristina, sede da Prefeitura na avenida principal na Várzea


          Situada em vale cercado por montanhas, Teresópolis tem suas peculiaridades. Não existe propriamente um local chamado de centro. O bairro mais turístico é o Alto, onde a cidade nasceu, de localização mais elevada. Já a maioria das lojas comerciais se situam na Várzea.  O fato de a cidade ter surgido no Alto pode ser comprovado pelo nome da igreja do bairro, Santo Antônio do Paquequer, denominação original da vila (o prédio de formato triangular não é tão antigo, datando de 1933, quando substituiu a igreja original). Já a matriz situada na Várzea é bem mais imponente. Inaugurada alguns anos depois, leva o nome da padroeira Santa Teresa d'Ávila, homônima da imperatriz em mais uma referência. 

Igreja de Santo Antônio de Paquequer


Igreja de Santa Teresa 
 

        Alto e Várzea são atravessados por uma avenida que recebe quatro nomes diferentes ao longo do percurso de 5,4  quilômetros  e que é mais conhecida como "Reta" no seu trecho da Várzea. Percorrer a Reta é um programa diferente para os motoristas cariocas graças aos sinais de trânsito, onde cinco luzes laterais menores vão se apagando em sequência antes de o sinal trocar para verde ou vermelho,  me fazendo lembrar os semáforos de largada de Fórmula 1. Outra diferença marcante para o trânsito do Rio é digna de elogios: as várias faixas de pedestres pintadas ao longo da via são efetivamente respeitadas pelos motoristas residentes, que param seus carros para a travessia de pessoas. 

Baía de Guanabara, com a Ilha de Paquetá  e Pão de Açúcar, vista a partir do Mirante do Soberbo


            Quem chega vindo do Rio já se depara com um cenário majestoso no Mirante do Soberbo. Podemos apreciar a Baía de Guanabara abaixo em dias claros e a série de picos da Serra dos Órgãos, assim chamada pelo formato dos picos em sequência, que lembram os tubos de um órgão. O destaque absoluto é o Dedo de Deus com a forma característica de mão esquerda com dedo levantado, tendo 1.692 m de altitude. Símbolo de Teresópolis, de onde é melhor avistado, o Dedo de Deus na realidade  pertence ao município de Guapimirim, uma vez que o mirante se localiza exatamente na divisa entre os dois municípios. 

Os picos vistos de praça no Alto


          Estes picos estão situados no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, parque criado em 1939 que abrange 200 km² de floresta espalhados por três municípios. A sede principal está situada em Teresópolis. O parque é afamado por suas piscinas naturais e por suas trilhas de todos os níveis de dificuldade para os caminhantes, algumas levando a vistas sublimes dos picos, que podem ser escalados. 

        Atualmente a entrada é gratuita, mas a guarita para veículos é fechada quando a lotação dos estacionamentos é atingida.  Na rodovia Rio-Teresópolis, alguns quilômetros abaixo, está situada a entrada de outra subsede do parque. 

Poço Dois Irmãos no Parque Nacional da Serra dos Órgãos - fonte: site oficial - parnaso.tur.br


         Teresópolis também possui fontes de água natural espalhadas pela cidade, originárias de cursos com nascente no parque. A mais conhecida é a Fonte Judith no Alto, com cinco bicas em formato de fauno e revestida com azulejos portugueses. Foi construída há 102 anos com o nome da filha do dono das terras, que teria sido curada de doença grave graças às propriedades da água.

Fonte Judith


         A grande quantidade de imigrantes e a temperatura de montanha inspiraram a presença de algumas construções em arquitetura alpina, com tetos bem inclinados ou detalhes da fachada em enxaimel. Um exemplo clássico é o antigo Hotel Higino, que foi por muito tempo o hotel principal da cidade e ponto de referência no Alto. O então grandioso hotel e cassino erguido na década de 1930 foi transformado em condomínio residencial 40 anos depois, sediando ainda por muitos anos célebres bailes de carnaval nas instalações amplas do térreo. 

O antigo Hotel Higino

          Por sinal, o dono do hotel, Higino da Silveira, batiza a praça principal do Alto a dois quarteirões dali, que nos fins de semana abriga a Feirarte, programa imperdível em Teresópolis para quem gosta de compras. Nas barracas da feirinha que ocupa os espaços da praça se encontra com preços atraentes um pouco de tudo, com destaque absoluto para peças de vestuário, inclusive as voltadas para o frio. 

Entrada da Feirarte, fechada em dia de semana mas enfeitada para o fim de ano


        A gastronomia é outro ponto de referência na cidade, especialmente com relação à culinária europeia. Há restaurantes para todos os gostos onde se pode comer bem. Misto de atração turística e  experiência gastronômica é a Vila St. Gallen, no Alto. Estabelecido no lugar onde a cerveja Therezópolis  é fabricada desde 1912, seu restaurante principal é uma espécie de pub especializado em comida alemã no estilo das cervejarias bávaras, onde chamam a atenção as torneiras por onde jorra a cerveja local. Há ainda uma tratoria, cafeteria e até uma loja de suvenires da cervejaria. Bastante concorrido costumava ser um tour do processo de fabricação da cerveja, que deixou de ser oferecido nestes tempos de pandemia. 

         Contribuindo ainda mais para a atmosfera de biergarten alemão, uma viela de cidadezinha alpina foi recriada nos fundos do restaurante, recheada de elementos que remetem àquela região: fachadas no estilo enxaimel, uma estátua de bobo da corte no pátio  e até uma pequena capela com o teto no formato tradicional de cebola. 

Biergarten da Vila St. Garten


         Porém eu estava também interessado em verificar um outro aspecto, desprezado pela maioria dos comensais e turistas. Tendo visitado e adorado a cidade de Sankt Gallen no nordeste da Suíça três anos atrás, queria comprovar se teriam retratado sua característica principal em alguma das construções típicas, fazendo jus ao nome do complexo. Bem, lá estava ele, quase despercebido na fachada em frente à estátua do bobo da corte: o oriel, a sacada fechada presente em muitas casas de St. Gallen. Ponto para o arquiteto. A grande atração da St. Gallen real, sua imponente abadia milenar outrora produtora de cerveja, foi lembrada tanto no nome quanto no aspecto da seção de fondues, no segundo andar da tratoria. Não pude conhecê-la, pois só fica aberta nos meses de inverno, época ideal para se degustar a iguaria suíça. Ótima oportunidade para voltar em julho á Vila.

 ⇨  Confira aqui o post sobre St. Gallen publicado no blog.  

         A Vila St. Gallen está aberta às quartas e quintas das 18 às 22h, nas sextas e sábados das 12 às 23h e no domingo das 12 às 18h, na rua Augusto do Amaral Peixoto 166, no Alto. 

O oriel em destaque na cor marrom no centro da fachada da Vila St. Gallen


       Um dos mais conceituados restaurantes teresopolitanos é o Dona Irene, mais conhecido como "Restaurante da Russa". Estabelecido nos anos 60 pela siberiana Eupraxia (cujo nome em português era Irene) e seu marido Mikhail, o restaurante é especializado em culinária russa tradicional, e hoje é comandado por uma discípula brasileira, Emília. A reserva é obrigatória, seja para o almoço ou jantar, e cartões de crédito ou débito não são aceitos. O restaurante não é barato (paguei 175 reais fora a água mineral e gorjeta em novembro), mas saí plenamente satisfeito, como sempre aconteceu nas vezes em que comi lá. 

          Banquete talvez seja um termo mais adequado para a refeição, não só pela quantidade de comida, mas também pelo fato de ser inspirada nos rituais da aristocracia dos czares de fins do século XIX, diferencial que torna o restaurante único. O ambiente, a louça e os trajes das atendentes já nos remetem àquela época. Dividida em quatro etapas, a refeição leva pelo menos duas horas e meia, por isso abandone a pressa do lado de fora e aprecie cada acepipe com a devida calma. Para entrar ainda mais no clima, a vodca artesanal Nazdarovia, receita de D. Emília, é cortesia da casa e vem bem gelada..  

Dez pratinhos formam a entrada no Dona Irene


         A lauta refeição se inicia com os zakuski, entradas diversas dispostas na mesa em quantidade pequena, como patês, arenque, salmão, caviar de berinjela e outros. A seguir, o chamado primeiro prato é dividido em duas partes: na primeira, é servido o borsht, um levíssimo creme quente de beterraba  acompanhado de pirozhki, bolinho de carne moída envolta em massa, muito bom; como bem salientou a atendente, o borcht se assemelhava a um consomé. Já na segunda chegam à mesa quatro travessas com iguarias quentes como asas de frango gratinadas, abobrinha também gratinada e suflê de berinjela ao molho de tomate. .

Borsht com pirozhkis


       Mas o melhor vem então - o prato principal, que deve ser escolhido para cada um no ato da reserva. Entre as opções disponíveis estão delícias como:

  • o estrogonofe original russo, que leva smetana, creme de leite azedo, flambado no conhaque.
  • o pojarski, espécie de almôndega de frango com gorgonzola coberta por croutons. 
  • filé mignon à moda russa, com champignon e molho picante de creme de leite.
  • caquille, um suflê de peixe ao molho branco com camarões. 
  • frango à Kiev, peito empanado recheado de manteiga.
  • varenikes, pastéis cozidos de batata acompanhados por cebola e escalopinho, da culinária ucraniana.
Na nossa mesa éramos quatro e havíamos solicitado dois frangos à Kiev e dois varenikes, justamente os pratos campeões de pedidos na casa. Meu frango à Kiev estava excelente, como de hábito com a manteiga escorrendo quente ao se cortar a carne. Para um batatólatra exigente como eu, as batatas fritas em parafuso estavam no ponto, sequinhas e gostosas. Provei ainda o varenike das minhas companhias; devido à origem eslava de meus avós, este é um prato que como desde criança, e estava muito saboroso.

Duas porções de varenikes e de frango à Kiev: prato principal

 

                Para culminar, não esqueça de reservar espaço para a sobremesa, também incluída no preço. Dentre opções como torta de nozes com chocolate e pavê de pitanga, escolhi a charlotte russa de laranja, fechando o almoço de sábado com chave de ouro. 

        O Dona Irene funciona na rua Tenente Luíz Meireles (rua de acesso à rodoviária) no nº 1800, no Bom Retiro, de quarta a sábado de 12 às 22h, com o último serviço às 20h. Aos domingos abre somente para almoço, de 12 às 16h. O telefone para reservas é (21)2742-2901.

           No próximo post, voltamos à série sobre os bairros do Rio de Janeiro.


 Postado por  Marcelo Schor  em 28.01.2022 


2 comentários:

  1. Muito interessante e rico, gostei muito!

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    1. Luciana, obrigado pelo comentário. É sempre legal receber feedback sobre os posts.

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