Pages

Suomenlinna, a incrível fortaleza diante de Helsinque

 

Ruínas da fortaleza em Kustaanmiekka


            O passeio a Suomenlinna, a fortaleza insular situada defronte a Helsinque, foi um dos pontos altos da minha estadia na capital da Finlândia. Um dos lugares históricos mais visitados do país, atrai um milhão de pessoas a cada ano e seu nome significa literalmente "fortaleza da Finlândia". É uma visita bastante agradável, onde se leva algumas horas percorrendo suas trilhas e conhecendo suas inúmeras instalações históricas, museus e até um submarino. 

Parede de pedra típica presente nas construções e muralhas de Suomenlinna, cobertas por vegetação.


                 Suomenlinna foi estabelecida pela Suécia em 1748 com o nome de Sveaborg (seu nome em sueco até hoje). Naqueles tempos a capital da Finlândia, na época ainda dominada pelos suecos, era Turku. Assentada em um conjunto de ilhas interligadas, a fortaleza surgiu como proteção para o já decadente império contra o avanço da potente Rússia. Ironicamente, quando os russos dominaram a Finlândia 60 anos depois os militares ali instalados simplesmente se renderam. A fortaleza teria ainda um papel decepcionante na Guerra da Crimeia em 1854, sendo bastante danificada pelos bombardeios inglês e francês devido ao seu armamento obsoleto; no entanto acabou não havendo invasão de Helsinque na ocasião.  

Mercado de Helsinque visto do deque do ferry


              A forma habitual de se chegar à fortaleza é tomar o ferry que sai do cais do mercado de Helsinque, no centro da cidade. O percurso é rápido, leva 15 minutos, e de quebra, se pode apreciar o cenário do centro histórico dominado pela vistosa catedral branca. Saindo aproximadamente a cada hora, o trajeto de ida e volta custava 6,20 euros. Não paguei nada na hora, pois tanto o ferry como os principais museus de Suomenlinna estão cobertos pelo Helsinki Card que utilizei nesse dia, reservando o meio da tarde em diante para visitar alguns museus da capital finlandesa . O ferry possui assentos em sua parte descoberta, ideais para apreciar a paisagem no trajeto. 

Mapa da Fortaleza de Suomenlinna, com as cinco ilhas interligadas


           Suomenlinna está espalhada por oito ilhas do Golfo da Finlândia, das quais cinco são interligadas por pontes (e um aterro que forma um istmo). Destas, três têm atrações turísticas que merecem ser conhecidas. Nos mapas que detalham o arquipélago, como o que consta na foto acima, aparecem grandes letras do alfabeto que acompanham o nome de cada ilha. Estas letras não são somente para enfeite: 8.000 pessoas habitam as ilhas, e como as ruas não têm nome, as casas são identificadas para efeito postal pela letra correspondente à ilha acrescida de um sequencial numérico. Existe então por exemplo a casa B12, na ilha de Susisaari.

Ponte unindo as ilhas de Iso Mustasaari e Susisaari, com um trecho da muralha


               Não é à toa que Suomenlinna foi nomeada Patrimônio Histórico da Humanidade pela Unesco em 1991, a primeira no país. Espalhada por 200 hectares, é um conjunto impressionante de 200 construções, hoje com funções variadas como instalações militares, museus, centros culturais, lojas, restaurantes e residências, além de seis quilômetros de paredes defensivas de pedra. Este conjunto diversificado aliado às trilhas com cenário ímpar é que torna Suomenlinna uma atração tão espantosa. 

Residências na ilha de Susisaari


              O ferry te deixa na ilha mais setentrional, das três a mais próxima de Helsinque, com muitas edificações do período russo. Bem em frente ao cais, numa delas está o escritório de turismo. onde se pode pegar o utilíssimo mapa do complexo, com a indicação de 50 locais de interesse. As ruínas históricas defensivas propriamente ditas se encontram nas ilhas subsequentes. Há uma trilha de 1,5 quilômetro que une o cais à parte mais impressionante das ruínas chamada Rota Azul, demarcada com sinais desta cor. Quem não quiser efetuar a caminhada de volta há um outro barco mais caro que une Helsinque e Suomenlinna, o water bus,  que também sai do mercado central mas possui o atracadouro junto às ruínas, e que só funciona nos meses de verão entre maio e setembro. 

Igreja de Suomenlinna, atualmente com fachada simplificada.


Na Ilha  Iso Mustosaari 

                   Após deixar o cais e seguir pela Rota Azul, logo passamos pela Igreja de Suomenlinna. O templo foi construído pelos russos em 1843 na fé ortodoxa e transformado posteriormente em igreja luterana. A igreja apresenta duas características incomuns: ela cumpre também a função de farol, ainda em operação no seu topo, e já possuiu em suas quinas quatro torres menores em formato de cebola, removidas com a independência da Finlândia em 1918, tornando a fachada mais simples (e menos atraente). 

Museu Suomenlinna com a torre da igreja/farol ao fundo


                 Continuando pela Rota Azul alcançamos a ponte pelo qual passamos à próxima ilha. Junto a ponte se encontra o museu principal da fortaleza, Museu Suomenlinna, focado na sua história . A mostra inclui um filme de 25 minutos sobre o assunto, exibido a cada meia hora em idiomas alternados. Do museu sai ainda um tour guiado.  Não cheguei a fazê-lo, mas passei por um minutos antes, com uma multidão de visitantes seguindo o guia. 

Grande Pátio com o Memorial de Ehrensvärd

Na Ilha Susisaari:

                   Ao passarmos pela ponte, adentramos a ilha  Susisaari ("ilha do lobo")  onde está a fortaleza propriamente dita - na realidade são duas ilhas unidas por um istmo aterrado. Ao atravessarmos uma passagem sob a muralha, encontramos uma pequena praça cercada por casas de aparência mais antiga. É o chamado Grande Pátio, onde está localizado o memorial de Augustin Ehrensvärd, o planejador da fortaleza, nascido em Estocolmo. Seus restos mortais foram trasladados para a praça poucos anos após seu falecimento, por ordem do rei Gustav III, já mencionado no post sobre Drottningholm. O túmulo é curioso, com base em granito  e com formato de barco nas pontas, encimado por apetrechos de guerra como um elmo, espada e escudo em bronze.

Museu Ehrensvärd

  
             Em frente ao túmulo encontramos o Museu Ehrensvärd, que ocupa a antiga casa do comandante da fortaleza, cujo primeiro ocupante foi o próprio Ehrensvärd. Lá podemos apreciar pinturas, móveis, armas e objetos pertencentes à época dos primórdios da fortaleza, na segunda metade do século XVIII. Há outros museus espalhados pela ilha, como o Museu Militar. o de Brinquedos e o submarino Vesikko, em operação na Segunda Guerra Mundial. Lamentei não poder ter visitado o Museu Militar, também chamado de Sotamuseo - era uma terça-feira, dia da semana em que o museu está fechado. 

           Atrás da muralha que acompanha o Grande Pátio se encontra o Dique Seco, um dique de estaleiro onde grandes navios da esquadra sueca eram construídos na época de atividade da fortaleza. Um dos estaleiros mais antigos da Europa, ainda funciona nos dias de hoje numa escala bem mais reduzida, dedicado a reparos em embarcações pequenas. 

Bastião Polhem

Paisagem das cercanias do Pavilhão Polhem, com Helsinque ao fundo


                Sendo este o núcleo administrativo da fortaleza de então, com muitas paredes de pedra, vale a pena se desviar da Rota Azul para percorrer as trilhas e enveredar pelo campo até chegar a trechos sobreviventes de bastiões que dão para o mar, com belas vistas para a cidade de Helsinque ao longe. Nessa época de fim de primavera a paisagem adquiriu um colorido ainda mais vivo com as muitas flores silvestres amarelas ao longo do caminho. 

O Parque Piper e o Bastião Härleman:  cenário bucólico junto à Rota Azul.


              Deixando o núcleo de casas ao redor do Grande Pátio, continuamos pela Rota Azul margeando o Parque Piper, um jardim bucólico considerado o primeiro em estilo inglês implantado na Finlândia. Logo adiante à direita chegamos ao início de uma trilha inicialmente sobre madeira que acompanha a costa. A dica é abandonar a Rota Azul e seguir por esta trilha; um pouco mais elevada, ela é muito mais cênica, propiciando passar pela fileira de  canhões que formava a artilharia de Suomenlinna. São canhões fabricados em São Petersburgo com tecnologia alemã nas décadas de 1860 e 1870, instalados pelos russos anos após o vexame na Guerra da Crimeia.  

 
Artilharia em Kustaanmiekka


                 Os dois caminhos correm em paralelo e ambos chegam ao ponto turístico mais conhecido de Suomenlinna: Kustaanmiekka (em bom português, "Espada de Gustav", em homenagem ao já mencionado rei Gustav III), na ponta sudeste do arquipélago.  É a parte mais fortificada do complexo, construída pelos suecos com as muralhas em formato de estrela, conforme os princípios estabelecidos pelo francês Vauban. 

Pátio das ruínas junto ao Portão do Rei


             O marco mais conhecido destas ruínas é o Portão do Rei, inaugurado em 1754 como a entrada principal da fortificação e está na localização exata onde o navio do rei da Suécia aportou dois ano antes quando o soberano veio inspecionar as obras. O portão é emoldurado com placas de mármore, e nela estão inscritas frases a mando do construtor Erhensvärd, dos quais uma ele considerava uma exortação ao povo finlandês: em tradução livre, "Doravante permaneça em seu solo e nunca dependa de ajuda externa".

           É no cais junto ao Portão do Rei que aporta o water bus vindo de Helsinque. 

Vista interna do Portão do Rei

... e sua vista externa, junto ao mar


           E foi em Suomenlinna que houve um dos acontecimentos mais bizarros que já ocorreram comigo nos muitos anos de viagem. Dando uma parada durante a caminhada para descansar um pouco, resolvi comprar uma casquinha de sorvete e a atendente me avisou para tomar cuidado com os pássaros, ávidos por roubar um naco do sorvete em voo rasante. Nada aconteceu, mas minutos mais tarde sofri um outro tipo de ataque aéreo. Após tirar uma foto da paisagem, baixei os olhos para verificar o resultado da foto e quando levantei a cabeça levei um baita susto. Um pato tinha acabado de alçar voo e vinha direto a toda velocidade  na minha direção. Não consegui desviar totalmente a tempo e a colisão foi inevitável - o pato se chocou com meu braço, soltando um grasnido horrível e quicando para trás, caindo inerte no chão. Por alguns segundos pensei preocupado ter causado um "paticidio" involuntário, mas felizmente a ave se levantou e saiu grasnando. Quanto ao meu braço, escapou ileso. Um susto inusitado que dificilmente vou esquecer.

Patos passeando pelas trilhas de Suomenlinna (nenhum desses foi o responsável pelo choque aéreo)


 No próximo post, o último da série, rumamos para Porvoo. .


⏩➧ Este é o décimo quarto post da série sobre a viagem à Suécia e Finlândia realizada em junho de 2023. Para visualizar os demais e o mapa do roteiro, acesse  o post introdutório da série .


 Postado por  Marcelo Schor  em 25.08.2024 


Nenhum comentário:

Postar um comentário

O comentário será publicado após aprovação